FREUD, PORCOS-ESPINHOS E QUARENTENA
Os memes com o tema são muitos: a múltipla escolha entre gravidez ou divórcio (à parte a perturbadora obesidade) como resultados finais do isolamento social, havendo, ainda, a opção “todas as respostas acima”. Se “gravidez”, faz alusão a uma maior disponibilidade para aquilo que aproxima, e “divórcio”, alude a uma maior exposição a aquilo que afasta, temos uma boa descrição da situação que vivem os casais em quarentena. Para alguns, é melhor que se fique mais junto; para outros, apesar de serem um veneno lento, parecem mais prudentes as limitações que a rotina impõe. Mas, e quanto à opção “todas as respostas acima”? Não haveria aí um certo paradoxo? Não me parece.
Em “Psicologia das Massas e Análise do Eu”, Sigmund Freud cita a fábula em que porcos-espinhos, para se aquecerem no frio, se aproximam uns dos outros, até que começam a se ferir mutuamente com seus espinhos, obrigando-os a se afastar. É fácil perceber o quanto esse dilema se repete em todos os relacionamentos humanos, embora também seja fácil perceber o quanto ele é desconsiderado.
Para que funcionem bem, os relacionamentos exigem sempre um bom cálculo da distância entre seus participantes. Nem tão distantes para esvazia-lo, nem tão próximos que ultrapassem limites de cada um. Entre casais, essa equação torna-se ainda mais difícil. As expectativas de “aquecimento” são muitas e variadas, e, como nossos espinhos mais íntimos ficam muito evidentes, os riscos de “ferimento” são maiores.
Talvez esteja justamente aí uma das bases de uma boa relação: o respeito à distância, nem maior e nem menor do que o devido, permanecendo perto, o bastante para aquecer, afastado, o bastante para evitar as arestas, e atento, sempre, para atualizar essa medida de acordo com cada momento.
Eder Schmidt
@drederschmidtpsiq