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CONFISSÕES A MÁRIO QUINTANA

Coluna: SEGUIMENTOS - por: Antonio Trotta - Jornalista, Escritor e Poeta - 11 de junho de 2025

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Um bom poema é aquele que nos dá a impressão
de que está lendo a gente… e não a gente a ele!

Mario Quintana

Caro Mário, muitos textos também são assim. São espelhos encantados que parecem refletir a nossa alma. Parecem nos colocar do avesso. É como se nos lessem por dentro. Dão, as palavras, o sentido do que realmente sentimos. Narram em versos, prosas ou descritivamente nossa mente, emoções e ações. Põem à vista o que parecia ser tão particular, peculiar. De repente, alguém tão distante, estranho resolve se expor e, simultaneamente, nos expomos, não mais nas entrelinhas, mas em frases abertas. Escancaradas.

Comigo, meu caro Mário, também é assim. Leio um texto e pronto, me vejo em evidência, à vista, a olho nu, despido das minhas próprias confissões. Alguém, sorrateiramente, parece me espreitar, a vida toda, e na primeira oportunidade, sem minha permissão, me coloca exposto, como estampado em manchete de jornal.

Quem escreveu isto? Como observaram tantas minuciosidades, insignificâncias? E, acredite, está lá, tudo que vivi, pensei, sonhei ou amei. Até mesmo as juras de amor parecem ter sido copiadas na íntegra. Mesmo as promessas eternas, ditas a dois foram colocadas em sequências e com todas as ênfases de um apaixonado. Quem, Mário, roubou minhas súplicas segredas, minhas balbúcias discretas e pronunciadas com a mais pura paixão?

Outro dia, ao ler um texto, deparei-me com a minha vida sobre o papel. Pensamentos meus, além de escancarados, bem escritos num texto assinado, não por mim, mas, sim, pelo seu próprio autor. Como gostaria de ter rabiscado, eu mesmo aquelas palavras. Nada é meu, mas nada me contradiz; tudo converge a mim e me descreve. Da minha vida sou o mestre; da forma que fora escrito, um aprendiz.

Ao ler, me leio. Percebo que ninguém escreve sobre mim, mas expõe a multiplicidade que a vida oferece, no tempo e no espaço e me coloca de cara, frente a frente com situações e emoções similares. Portanto, como um bom poema, passo a ter, meu caro Mário, a mesma e pura impressão de que estou sendo lido. E, acabo por me divertir, pois me leio no que vivi quando criança até o presente. Ao me ler nos textos, sei do que fui capaz de realizar e de sonhar. E quando um texto, poema ou poesia lê a gente é porque ele foi escrito com a alma.

Mário, confesso que, às vezes, me encontro em muitos contos, da mesma forma que me sinto um dilema em vários poemas, ou como heresias em algumas poesias.  Por favor, nada me escreva, para que eu não me leia e arrume outro pretexto para escrever à sua alma de poeta, Mário, outro texto.

 

Antonio Trotta

Jornalista, escritor e poeta

Foto de Mário Quintana –  Imagem: Acervo IMS

 

 

8 Comentários

  1. Caro Trotta. Comigo acontece o mesmo. E, sempre me questiono: “ Queria ter escrito esse texto”. Coincidências? Conspiração do universo? Quintana e Neruda parecem falar o que eu penso e quero escrever ou gostaria de ter escrito. Quintana pela profundidade na simplicidade e Neruda pela paixão, pelo coração escancarado. Crescemos mas continuamos tendo nossos ídolos e sonhamos. “Tudo vale a pena…”

    1. Sim. Eles são partes de nós. Aprendemos a viver e a conviver com seus textos maravilhosos. Parecem falar de nós com intimidade. Gratidão.

  2. Realmente, nossos escritos são nossas confissões emocionais ! Muitos se igualam aos pensamentos de escritores ,pois somos nós quem expõem nossos sentimentos. É belo nós ver partilhando dos nossos afetos. Felizes somos nós!
    Muitos passarão, mas, nós PARARINHOS!!!!

  3. Um espelho nas palavras! Quanta identificação entre nós escritores que nos entrelaçamos por entre letras… Sua homenagem a Quintana é encantadora. Você uniu as pontas de cada palavra…e ao mesmo tempo fez com que elas voassem soltas provocando nossos olhos para colher rápido e deixar nossa alma saborear sua inspiração!
    Parabéns Trotta! Gratidão Vitalícia por cada publicação!

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