MEMÓRIAS DE ZÉPERRY, DO “PEQUENO PRÍNCIPE” E SEU DECA DO CAMPECHE
por: Esther Lúcio Bittencourt
Zé Perry trabalhava na Aéropostale, (Compagnie Générale Aéropostale), companhia de aviação fundada em 1919, na França para popularizar a aviação e estabelecer linhas de conexão para o serviço aéreo postal.
Estátua de seu Deca no Campeche (acima) e Foto de ZePerri (google, a foto do piloto)
A Aéropostale aproveitava o serviço de pilotos veteranos da Primeira Guerra Mundial. Criou rotas aéreas entre a França, África e, posteriormente, América do Sul, e seu campo de pouso ficava no litoral de Santa Catarina, precisamente nas dunas do Campeche.
Zé Perry, que pilotava alguns vôos para o Sul, -escreveu o livro Correio do Sul- conheceu no Campeche o pescador Deca de quem ficou amigo. Com ele pescava nas águas do Campeche e preparava sua refeição de peixes e pirão.
Dona Chica, casada com Deca, o Manoel Rafael Inácio, e que na época tinha 16 anos, dizia para os netos que não se recordava de Saint Exupéry, o Zé Perry, no linguajar do povo simples da região, ou Manezinho da Ilha. No entanto ela não era casada quando Seu Deca o recebia para comer pirão e outros pratos locais, caçar marrecos e manter, como podiam, uma conversa. Seu Deca, no entanto afirmava que seu amigo ZePerri conheceu alguns dos seus 14 filhos.
Diz seu neto, Samuel Tito Inácio, 47 anos, “que,se ela estava com as faculdades mentais ainda boas, ninguém sabe. Obviamente que os pilotos ficavam muito tempo por aqui, durante as escalas dos voos para a Argentina e mais outros 11 locais, pois os aviões eram muito rudimentares e precisavam de manutenção. Não havia como voar longas distâncias, o tempo inteiro, naquela época. Muitas informações se perde na memória das pessoas, mas meu tio Getúlio escreveu um livro sobre o assunto “Deca e Zé Perri”,( a grafia de Perri varia de documento para documento) edição bilíngüe (francês-português), lançado em 2003, com ajuda da Universidade Estadual de Santa Catarina-UDESC_ que o auxiliou nas pesquisas, juntamente com historiadores francêses.
O nome dele virou Zé Perri porque ninguém sabia pronunciar seu nome: Antoine de Saint Exupéry. Imagina meu avô, né, a comunicação difícil e ainda havia a mania das pessoas antigas de botar apelido em tudo! Uns até dizem que o Campeche ficou com este nome porque ele o chamava de Champ de Pêche, Campo de Peixe. outros dizem que o nome é originário de uma planta nativa, o pau de campeche, que tem também no México. Esta vegetação foi extinta aqui.”
Samuel Tito Inácio é servidor público do Deinfra-Departamento Estadual de infraestrutura do Estado-, formado em química e dá aulas no Colégio do Morro das Pedras e na Tapera ministra educação para jovens e adultos, ensino médio.
Galho do Pau Campeche que ainda existe, principalmente na península de Yucatán, no México.
A Aéropostale, após ser desativada doou o campo de pouso que havia comprado para a aeronáutica. Hoje, há um marco que conta a história do local e um campinho de futebol onde pousavam e levantavam voo os aviões. Abaixo o antigo campo de pouso da Aeropostale.
“Vô Deca nunca desejou voar com Saint Exupéry que sempre o convidava, segundo contava, pois tinha medo, “imagine pegar um avião na década de 20, para este povo simples, devia ser como uma nave espacial. Havia ainda a diferença do idioma, como eles se entendiam? A cultura de um era totalmente diferente da do outro.”
JOGO DE DOMINÓ
Todas as manhãs, segundo os jogadores, faça sol ou chuva, durante os 365 dias do ano eles se reúnem em frente à casa de embarcação e de rede dos pescadores, o rancho de pesca, para jogar dominó. A rede é de Getúlio Manoel Inácio, filho de seu Deca, que estava no velório de um amigo, outro dono de rede.As redes de pesca são enormes, levadas para alto mar, onde os peixes aparecem. Ser dono de rede é ter trabalhadores que ajudam a jogar e trazer a rede de volta do mar.
A rede de Getúlio foi comprada de seu Deca, por ele e um irmão.
Seu José Pamplona, nascido em 1936, um dos jogadores de dominó, o de camisa azul é cético: apesar de todas as pesquisas históricas apontarem para a passagem do autor de “O pequeno Príncipe” pelo Campeche, ele afirma que tudo é apenas um sonho. Ele conheceu o comandante do campo do Campeche, seu Jacquinot. “Em 1947, quando eu já morava aqui no Campeche já não pousavam mais aviões aqui. E o tal de Ze Perri nunca vi. Até a Avenida Pequeno Príncipe não existia há 20 anos atrás. Era a Estrada Geral do Campeche.
(foto)
Monsieur Joseph Jacquinot costumava caçar jacarés então existentes na lagoa do Campeche – e os comia. Ia caçar todo paramentado, usando calças curtas, chapéu, bota e espingarda. Era uma figura estranha para os pescadores. Em 1939, os franceses retornaram para França como reforço para combater Hitler. O aeródromo do Campeche continuou funcionando até 1949, operado pela Pan Air do Brasil.
As cidades que a Aéropostale percorria eram Barcelona, Elche, Málaga e Alicante (Espanha), integrando a rota da Europa; Rabat, Agadir, Tánger Casablanca, Dakhla e Tarfaya (Marrocos), São Luís e Dakar (Senegal), Nouadhibou (Mauritânia), no continente africano; e Natal, Salvador, Caravelas, Recife, Vitória, Rio de Janeiro, Santos, Pelotas, Porto Alegre e Florianópolis (Brasil), Montevídeo (Uruguai), Mendoza e Buenos Aires (Argentina), além da cidade de Santiago (Chile), finalizando a rota da América do Sul.
Nenhum dos jogadores aceita ser chamado de manezinho da ilha, nome dados aos habitantes locais. “Manezinho é quem fala mal, se veste mal, é uma figura folclórica tratada em tom pejorativo. Até nosso Guga, o grande jogador de tênis é conhecido como manezinho da ilha!” diz Dioclécio Vieira, 65 anos, o que usa boné azul.
Rancho de pesca
Ao fundo a Ilha do Campeche onde existem figuras rupestres
Avenida Pequeno Príncipe. Antes era chamada de Avenida Geral do Campeche
Deca morreu em 1993, aos 84 anos em 1991 foi homenageado com um troféu, pela Aeronáutica por ter prestado serviço aos pilotos franceses. Saint Exupéry, Antoine-Jean-Baptiste-Marie-Roger Foscolombe de Saint-Exupéry, morreu em julho de 1944, em missão na Segunda Guerra Mundial, aos 44 anos.
Deca sobreviveu para contar a história de Zéperri na Ilha de Florianópolis, em Santa Catarina, bairro do Campeche.
O trabalho final de Saint-Exupéry foi para coletar inteligência sobre os movimentos de tropas alemãs em torno do Vale do Rhone anterior à invasão aliada do sul da França (“Operação Dragão”). Na noite de 31 de julho de 1944, ele decolou de uma base aérea na Córsega, e não retornou.
DOCUMENTÁRIOS
Mônica Cristina Correa fez o documentário, apoiada por pesquisas históricas, no Brasil e na França, “De Saint Exupéry a Ze Perry” que conta a história do piloto nas areias do Campeche e seus voos noturnos.
Mônica Cristina Corrêa : De Saint-Exupéry à Zeperri.
Quando o filme foi exibido, no Cinema Dona Chica estiveram presentes as sobrinhas netas de Ze Perri.
As francesas Hélène de Sèze e Isabelle D’Agay vieram ao Brasil para prestigiar o lançamento nacional do documentário “De Saint-Exupéry a Zé Perri”, em Florianópolis e aproveitaram para assistir ao espetáculo “Um Príncipe Chamado Exupéry” , da Cia Mútua.
Hino do pescador artesanal – Campeche – 01 maio 2011
Apresentação do Hino do Pescador na praia do Campeche. 1º de maio de 2011. Inauguração da escultura em homenagem ao Pescador Artesanal de Beira de Praia, representado pelo seu Deca, amigo do aviador Saint-Exupéry [autor do livro “O pequeno príncipe”], popularmente conhecido como Zé Perry.
O autor de Terra dos Homens, Voo Noturno, Correio do Sul e do O Pequeno Príncipe, Saint-Exupéry, conhecido como o “poeta da aviação” trabalhou entre 1929 a 1931 na sede argentina da Aéropostale. Sobrevovou várias vezes a costa do Brasil. Próxima a Buenos Aires ficava a escala de Florianópolis, em Santa Catarina, no bairro do Campeche.
Zé Perri no Campeche, é outro documentário dirigido por Zeca Pires e seus alunos da Unisul (2000)que foi premiado no Festival de Gramado . Trata sobre a presença do escritor francês na região. Saint-Ex, como era chamado, casou-se com Consuelo, salvadorenha que conheceu em Buenos Aires, na época da Aeroposta Argentina.
Exposição sobre a passagem na ilha de Florianópolis precisamente na praia do Campeche do piloto-escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, nascido em Lyon em 1900 e desaparecido durante uma missão de reconhecimento na Segunda Guerra Mundial em 1944, legou às futuras gerações uma das obras literárias mais celebradas no mundo: O Pequeno Príncipe. Traduzido em mais de 200 línguas, O Pequeno Príncipe foi também ilustrado pelo autor e se tornou um fenômeno editorial sem par no século XX e assim prossegue no século XXI….
Curadoria: Mônica Cristina Corrêa
Ilustrações: Juliana Góes
Arte: Victor Carlson
Leiaute: Marcelo E. Nogueira
Assistente de produção: Annye C. Tessaro
Tradução em francês e apoio pedagógico: Jean-François Brunelière
Publicado originalmente no jornal
http://primeirafonte.blogspot.com/2011/12/senhora-do-tempo-memorias-de-zeperry-do.html?m=1