Logo após deixar o aeroporto La Guardia, o A320 comandado por Chesley “Sully” Sullenberger, levando 155 pessoas, colidiu com gansos, sofrendo pane nas duas turbinas. Percebendo não haver altura ou velocidade para retornar ao aeroporto, Sully viu como única opção o pouso no rio Hudson, salvando todas as vidas, e se transformando em herói pela mídia.
Porém, o incidente torna-se objeto de investigação de um órgão federal, convencido de que a escolha de Sully foi intempestiva e equivocada, colocando desnecessariamente vidas em risco, já que, pelos computadores da Airbus, haveria duas alternativas de pouso de emergência. Em audiências, Sully deverá justificar sua conduta perante uma comissão de sindicância. Seu argumento, refutando o que afirmavam os computadores, era o de que sua longa experiência como piloto lhe dava a certeza de que as alternativas apresentadas levariam, inevitavelmente, à catástrofe.
Os corregedores estão certos de que contra computadores não há argumento, vendo como arrogante a insistência de Sully. Mas, não há arrogância ali, e a nova postura da mídia, apoiada na insistência da Comissão, desperta uma angustiada autocrítica no velho comandante. Afinal, ele sustenta uma posição baseada no “fator humano”, perante argumentos fornecidos por um computador.
Trata-se de um filme sobre heroísmo. Mas, além das vidas salvas, o heroísmo de Sully também se expressa em seu enfrentamento aos corregedores. Quanta coragem é necessária, nos dias de hoje, para se afirmar o fator humano, a subjetividade, como argumento, em um mundo que cultua a objetividade, o mensurável, o resultado inequívoco!
Mais do que previsível, o final já é sabido; a história é real. Mas, uma questão permanece: que espaço ainda resta em nossa cultura para o “fator humano”? Manuais, guidelines, evidências e estatísticas (sem dúvida imprescindíveis) parecem ter se tornado seus substitutos plenos e definitivos.
A experiência vivida, fundamento das motivações subjetivas, é vista como enganosa, e de fato o é. Como também o são aqueles parâmetros que, com toda a sua positividade, ainda são escolhidos e interpretados por algum ser humano, como tal, falível.
@drederschmidtpsiq
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