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Inez Cabral

A coluna de hoje é com Inez Cabral – Acadêmica Correspondente

Cheguei à conclusão de que essa pandemia está acabando com o otimismo e o senso de humor que costumam caracterizar-me. Respiro fundo, olho para o céu sem nuvens, o Pão de Açúcar, a gaivota que sobrevoa a cidade e o mar ao longe. Como a realidade que tanto prezo está negra, reviro meu baú de memórias à procura de eventos mais divertidos para aliviar a minha mente:

Ele é feio. Isso é o que ele pensa, o que o torna ainda mais feio. Está sempre só, é uma sumidade em sua profissão, mas é feio. Vê as mulheres que suspiram enquanto admiram galãs da TV e tentam modelar-se como as garotas das capas de revista. É silicone prá cá, malhação pra lá, escova, alisamento, (na época, o lindo cabelo crespo era desabonador) tratamento de pele, maquiagens pesadíssimas que as tornam bonecas de gesso. Mas é moda. Não, não existe mais moda é o que dizem essas meninas, cada um usa o que quer. Mas todas viram louras, longas madeixas, cílios postiços, unhas quilométricas, não por moda, elas não ligam, mas para serem diferentes. A autossugestão é um milagre. Antes, o que havia em comum entre mulheres ditas bonitas, era apenas a leitura obrigatória do Pequeno Príncipe. Não mais. Ler queima as pestanas e cansa a vista. Melhor folhear revistas, suspirar por um novo nariz ou uma nova cor de cabelo. Ninguém mais usa seu tom natural, existem mechas, luzes, cores e brilhos que as hipnotizam, junto com as opiniões dos cabeleireiros, que são seus gurus. Olham com pena para aquelas que assumem seus quilos a mais, seus cabelos brancos, suas unhas curtas, sua cor de jambo ou de chocolate. “Coitadas” é o que pensam.
Mas ele é feio. Apesar de achar essas mulheres ocas, fúteis e artificiais, e porque não dizer burras, não perde a chance da cantada. Só faz levar fora, mas tudo bem, esperava por isso, e não se abala.
No trabalho tem uma colega, daquelas de antigamente, natural e sem “adaptações” que um dia lhe pergunta:
—Fulano, você não cansa de levar toco?
—Claro que não. Fiz a minha estatística particular: Para cada cem tocos, dou uma dentro. Por isso continuo tentando. Só não tento com você, porque é simplesinha demais—diz com um sorriso, onde se deixam ver seus dentes tortos e amarelos.
—Que pena! era mais uma para aproximar você da centésima —responde sorrindo e acenando para o “gato” do escritório, cujo rosto se ilumina, com um sorriso imaculado.
Mais um descartável para a sua coleção.

 

Academia Caxambuense de Letras – março de 2022

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