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MISSA DO GALO – ESPECIAL ACADEMIA CAXAMBUENSE DE LETRAS

Esther Lúcio Bitencourt

Acadêmicos da Academia Caxambuense de Letras utilizando o famoso conto de Machado de Assis, que motivou contar a experiência pessoal de cada um, com alguma ficção, tem por fim desejar a todos nestes anos atribulados da pandemia um momento de leitura com o tema natal e alguma felicidade que, quem sabe, possa vir em breve.

Missa do galo

Venina, com sua sombrinha rosa, passou perfumada pela sala e deixou o rastro do perfume da Coty tão em voga naqueles tempos de ajantarado e o hábito de pegar a fresca nas calçadas quando os vizinhos colocavam assuntos em dia. E como havia assunto!

– Aonde vai, Venina?

– A missa do galo. A senhora não vem dona Ruth?

-Depois de preparar a alitria irei com Eugênio que já se apronta. No entanto creio que você exagerou no perfume. A Igreja é pequena, ficará cheia de amigos e muitos não gostam de perfume.

-Irão se acostumar, ora.

O relógio da sala, um carrilhão antigo, deu sinal de vida o que fez Ruth desligar o fogo e ir ao quarto se preparar.

Na rua os ruídos dos saltos e das pisadas firmes dos homens acentuava a hora. Todo natal era assim. A Capelinha da Viterbo não comportava tantos e obrigava que algumas famílias ficassem de fora, na rua de ladeira quer subiam em zig- zag, para ouvir a oratória do padre Zezinho que sempre fazia colocações certeiras endereçadas a alguém.

-Pai, por que missa do galo.

-Ah, filho, em Toledo, na Espanha, os lavradores matavam um galo na véspera de natal para lembrar que um galo cantou antes de Pedro negar Jesus por três vezes. Depois cozinhavam o galo e os distribuíam entre os menos afortunados que tinham o que comer no natal. Alguns levavam o galo para cantar durante missa.

Dona Cleonice cutucou o marido que atendeu.

-Não conte ao menino estas invencionices da Espanha.

-Mas é verdade, mulher.

-Miguel, mamãe sabe o porquê. Na noite do dia 24 para 25 um galo cantou tão alto e formoso, como nunca fora ouvido, para avisar o nascimento de Jesus.

-Por isto que em algumas casas tem um galo de ferro no telhado, mãe?

-Não deve ser. É só um cata-vento, filho.

-Mãe, prefiro o galo do papai.

– Pode preferir, mas, quando voltarmos para casa, ceiaremos um peru.

Pssiiii. Fizeram os que ficaram atrapalhados com a conversa.

A família aquietou.

Nisto um homem rompeu pela capela. Gritava por Gisela.

-Estou te esperando na esquina tem hora.

Padre Zezinho não se conteve: “estamos em oração, não venha cantar de galo aqui.”

Os fieis não se contiveram e a meia-noite soou com uma coletiva gargalhada acompanhada de sinais da cruz.

Durante o ano inteiro, ao pegar a fresca nas calçadas, o assunto estava garantido.

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