A coluna de hoje é com Leandro Campos Alves, Presidente da Academia Caxambuense de Letras
O Turco e o Libanês
Há alguns anos atrás, presenciei um acontecimento muito engraçado da criatividade do turco Salim, conhecido como um dos melhores comerciantes da nossa região.
Salim tinha um amigo Libanês, chamado Kaleb, de personalidade leve que passava as noites na boemia, bebendo. Era um grande gozador, um sátiro, porém de pavio curto e se tornava violento, como as tempestades no deserto.
Neste dia em questão, estava eu na loja de Salim, trocando com o amigo algumas palavras e pondo a conversa em dia. Adorava vê-lo tropeçando em nosso idioma, pois Salim viera para o nosso país sem conhecer nada, nem mesmo o mínimo possível de nossa língua.
Lembro-me daquele dia como se fosse hoje, pois Kaleb entrou na loja do amigo para comprar uma calça, na época o brim era usado na maioria das confecções.
Assim narro parte de sua conversa.
“__ Salim, quero comprar uma calça boa e barata, e não vem querendo me passar a perna com sua fala mansa, pois já te conheço há anos.
__Pode ficar tranquilo, Kaled, Salim só fala a verdade. Na loja de Salim tudo é baratinho, baratinho e de ótima qualidade, eu lhe garanto.”
Entre uma peça e outra que Kaled experimentou, ele vestiu uma peça que coube como uma luva em seu corpo, caimento perfeito.
Na negociação, Kaled várias vezes perguntou ao amigo se o material da calça não encolhia após a lavagem, tendo como resposta a afirmação firme de Salim que ela não encolheria nenhum centímetro, reafirmando, novamente, que suas roupas eram todas de qualidade.
Kaled saiu da loja do amigo Turco vestindo a calça que acabara de comprar, pois já estava atrasado e tinha pressa.
Dias mais tarde, lá estava eu, novamente, dentro da loja do amigo Salim, quando pude ver uma cena elucidada.
O Libanês caminhava a passos largos em direção a loja. Estava furioso, pude observar que Kaled estava vestido com a calça que comprara na loja de Salim semanas atrás.
Porém o que me chamou a atenção foram as palavras de raiva que Kaled gritava na rua.
“__Hoje eu mato aquele Turco desgraçado, mentiroso. Comprei dele uma calça e não uma bermuda.”
Comecei a rir quando vi que a calça estava “pega-frango”, foi quando entendi o perigo da situação, pois Turco e Libanês nunca foram muito amigáveis, ambos de personalidade forte partiriam para a agressão, na certa.
Salim, por sua vez, estava ao lado do caixa, ouvindo os berros de Kaled. Ainda pedi ao amigo Salim para se esconder e deixar as coisas esfriarem. Eu tinha certeza de que a briga seria horrível, tamanha era a fúria do Libanês.
Mas Salim não demonstrava preocupação nenhuma, quando vi a sombra de Kaled entrar na loja, com seus passos pesados, sua voz ríspida e sua raiva no olhar.
Pronto o confronto para mim era inevitável.
Assim que Kaled pôs os pés na soleira da loja de Salim, Salim falou ao amigo.
“__Lê, como você cresceu!”
A briga acabou naquele exato momento. Não havia quem não estivesse rindo com a observação irônica de Salim. Até mesmo Kaled caiu na risada, afirmando que o Turco não valia nada mesmo, porém era muito sátiro.
Leandro Campos Alves – Caxambu/MG
Academia Caxambuense de Letras – dezembro de 2021