Cultura e Lazer

ESPECIAL – A SÉRIE QUE VI

Big Little Lies

Uma brincadeira de crianças bem pequenas consiste em nomear erradamente coisas que ela conhece bem, falseando, de maneira divertida, sua comunicação. Perceber a possibilidade de mentir é adquirir a aquisição da noção de espaço íntimo, com a delimitação fundamental entre o mundo interno e o mundo externo. Há, então, a possibilidade de escolhermos entre o que o outro saberá e o que não saberá do que somos ou queremos. O problema é que, mentindo repetidamente, pode-se acabar acreditando na mentira e esquecendo a verdade.

Essa é uma das pautas de Big Little Lies: a expectativa de que o aparente corrija as contradições, as frustrações e as más escolhas, e se imponha como verdade própria. A série propõe que todos têm algo a esconder, ainda que se viva entre vitrines abertas para o horizonte.

Em uma festa ocorre um assassinato, sem que a vítima ou o assassino sejam revelados. A narrativa retorna a meses antes, se encaminhando33 para o fato, em meio ao cotidiano dos personagens. Madeline é uma mulher forte, rica, com uma filha do casamento atual e outra, adolescente, do casamento anterior. Sua amiga, Celeste, é uma advogada não atuante, mãe de gêmeos. Jane é uma jovem mãe solteira recém chegada à cidade, onde pretende criar seu filho Ziggy. Madeline e Celeste têm um litígio com Renata, rica executiva cuja filha, agredida na escola, acusa Ziggy de ser o agressor.

Porém, um rápido circuito pelas vidas daquelas mulheres revela outra paisagem para além de sua beleza, evidenciando o lado oculto que a mentira de cada uma tenta negar. Cada casal busca sustentar uma imagem idealizada (e, com mais espaço, falaremos mais sobre eles). Elas, por sua vez, são ricas, bonitas, vivem em lindas casas, e cada uma encarna, à sua maneira, um modelo de perfeição, sempre à custa de algo que, paradoxalmente, vale mais do que é ganho.

Nada mais comum do que se apostar na aparência como uma ponte entre o que se é e o que se pretendia ser. Mas, essa ponte é frágil, e a mentira costuma se revelar através das contradições e do desespero. Mentiras à parte, sobra apenas o que somos, confortáveis ou desconfortáveis dentro daquele espaço íntimo tão cedo e divertidamente adquirido.

@drederschmidtpsiq

Comentários

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo