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Por: Aquiles Rique Reis - vocalista do MPB4

Viva os instrumentistas

“Tava jogando sinuca, uma nega maluca me apareceu, vinha com um filho no colo, e dizia pro povo que o filho”. Acordei com essa música de Evaldo Rui e Fernando Lobo na cabeça. Em plena manhã de uma sexta, encasquetei com a música cantada por Linda Batista, de que só sei os primeiros versos.

Enquanto na minha cabeça rolava o “Tava jogando sinuca…”, comecei a achar que aquilo poderia ser um aviso, uma premonição, sei lá…

Mas vamos lá: veremos hoje o CD recém-lançado Espelho do Som (independente, com auxílio do Proac), álbum instrumental e autoral do acordeonista Toninho Ferragutti e do clarinetista e saxofonista Nailor Proveta. Antes de seguir, ressalto que eu tenho a maior admiração por instrumentistas que ajuntam seus instrumentos para com eles buscar novas texturas, novas sonoridades.

Meu Deus, mas o “Tava jogando sinuca…” dominava minha cabeça. Epa, guentaí, será que o “filho no colo” não seria influência daquele CD anterior, quando tratei do álbum instrumental do sete cordas de Alessandro Penezzi e do bandolinista de dez cordas de Fábio Peron?

Parêntese: tomando uma gelada no botequim, comentei com os amigos que comigo dividiam a mesa que eu já ouvira separadamente o acordeom de Ferragutti e o clarinete e/o sax alto de Proveta e os considerei instrumentistas exuberantes. “Tava jogando sinuca…”; mas de novo?

Pois bem, viajei total, saca só: dizem no mundo da música que, antes mesmo de Proveta e Ferragutti decidirem topar a parada, seus instrumentos conversaram animadamente, sonhando como seria se os dois gravassem juntos pela primeira vez. Premonição?

Caramba! Será que o tal do “vinha com o filho no colo” vinha de achar – pelo menos na música – que Penezzi e Peron eram os pais? Apesar de dizerem por aí que queriam porque queriam colocá-lo à força no colo de Ferragutti e Proveta? Um arrepio ouriçou meus pelos.

Os timbres ajudam, o suingue empolga e Toninho Ferragutti e Nailor Proveta arrasam. Na primeira faixa está “Bagualina” (Toninho Ferragutti). O que se ouve ali é uma enlouquecedora sequência de notas, nas quais os caras projetam seus sons de maneira a causar impacto fulminante nos ouvidos alheios. E conseguem.

Em “Valsa do Minuto” (Nailor Proveta) o acordeom chama a flauta, juntos trazem à tona um som grave, que preenche o arranjo de forma delicada. Antecedendo a flauta, volta à levada. Vibrando na mesma sintonia, momentos leves alternam instantes aflitivos. Ralentando e affrettando, é como se bailassem num salão musical.

Em “Pai Nosso” (NP), ora um, ora outro e os timbres evoluem em dinâmico equilíbrio. O arranjo é formidável.

Em “QuarenteMa 28” (TF) Ferragutti e Proveta seguem brilhantes até fechar a tampa. Nesse tema a melodia é suave. Frases ricas, em sequências arrebatadoras, quase sempre em duos alucinantes, cuja gravação eu inscrevo em minha lista de melhor faixa do álbum Espelho do Som – uma feliz sincronia. Meu Deus!

Mas e o samba de Evaldo Rui e Fernando Lobo? Ué! Samba? Que samba

 

Sobre o Colunista: 

Aquiles Rique Reis, niteroiense, logo se dispôs à vida. No MPB4 desde 1965, foi como se tivesse nascido para sempre cantar e muito sentir as dores do mundo, que são também suas. Hoje, ele canta, e há quinze escreve sobre música, com isso se encontra e vive. 

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