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PESQUISA DA UFLA, EM PARCERIA COM OUTRAS INSTITUIÇÕES, BUSCA CLONAR ÁRVORE-SÍMBOLO DA CONJURAÇÃO MINEIRA

A gameleira secular – à sombra da qual foi exposta parte do corpo de Tiradentes após sua execução, ao fim da Conjuração Mineira – está em estado debilitado, devido a cortes, incêndios, doenças, ataques de insetos e outros tipos de depredações que sofreu ao longo do tempo. Mas uma pesquisa científica está sendo desenvolvida na Universidade Federal de Lavras (UFLA), em parceria com outras instituições, com o objetivo de clonar a árvore considerada testemunha viva do movimento que marca a história de Minas Gerais e do Brasil. O estudo dará origem a clones em estado rejuvenescido, ou seja, com vigor suficiente para seu adequado funcionamento e resistência.

A demanda para a conservação da árvore centenária surgiu em 2015, por meio de uma ação movida pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), devido à relevância histórica da planta. A gameleira está localizada nas dependências do Sítio da Varginha do Lourenço, que fica às margens da Estrada Real, na MG 129, entre Conselheiro Lafaiete (MG) e Ouro Branco (MG), no trajeto do Caminho Novo. O sítio arqueológico foi tombado em 1989 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha/MG) e demanda ações gerais de conservação. O local foi um dos espaços onde Tiradentes e seus aliados se reuniam para planejar as ações da Conjuração Mineira, movimento separatista contra o domínio colonial português, que perdurou de 1789 a 1792.

Atualmente a pesquisa para a conservação da gameleira faz parte de um convênio entre a UFLA e a empresa Gerdau, gerenciado pela Unidade de Pesquisa e Inovação em Campos Rupestres Ferruginosos da multinacional. Um dos procedimentos que estão sendo utilizados na Universidade é a clonagem, pela qual se originará uma “cópia” da árvore original, gerando mudas que possuem características genéticas idênticas às da árvore-mãe, porém rejuvenescidas. Por meio da propagação vegetativa, ocorre a multiplicação assexuada de partes da planta, como células, tecidos e órgãos, dando origem a uma planta clonal.

Metodologia e etapas da pesquisa

Na UFLA, o estudo é realizado desde 2020, conduzido pelos pesquisadores e estudantes que atuam no Laboratório de Cultivo in vitro de Espécies Florestais, localizado no Departamento de Ciências Florestais, da Escola de Ciências Agrárias de Lavras (Esal/UFLA), sob a coordenação do professor Gilvano Ebling Brondani. A equipe busca clonar a árvore e rejuvenescer seus tecidos por meio da técnica de micropropagação, com a qual é possível obter melhores resultados de enraizamento futuramente. A técnica permite o crescimento e multiplicação da planta in vitro, em meio de cultura artificial, sob condições de luminosidade, temperatura e fotoperíodo controlados.

Para que seja possível clonar e rejuvenescer a gameleira, a pesquisa foi dividida em duas etapas. Na primeira etapa é realizada a técnica de enxertia, que será utilizada como estratégia de propagação apenas para resgatar a árvore-mãe e cultivar mudas na UFLA. O objetivo é a formação de tecidos vegetais que contêm células com grande capacidade de divisão, chamados de meristemas, para serem posteriormente inoculados in vitro (em tubos de ensaio, no laboratório).

O método de enxertia adotado é o de garfagem, que consiste na união de duas partes de plantas diferentes (árvore-mãe e muda produzida a partir da semente da árvore-mãe), as quais irão compor o enxerto e o porta-enxerto, respectivamente. O porta-enxerto é a base de uma muda enxertada, sendo responsável pela sustentação da planta e funcionalidades da raiz. Ele é formado por uma muda jovem, produzida a partir de sementes coletadas da árvore-mãe, o que aumenta as chances de cicatrização da planta devido à maior compatibilidade entre os tecidos. O enxerto é o broto coletado da árvore-mãe, e será responsável pela formação da parte aérea, sendo esta a parte da planta caracterizada como clone.

Até o momento, foi possível obter apenas três mudas germinadas in vitro, utilizando a técnica de micropropagação, a partir de sementes que foram coletadas da planta-mãe. Elas poderão ser multiplicadas para a produção de porta-enxertos.

A segunda etapa começará após a obtenção de plantas enxertadas da árvore-mãe, em que os esforços da pesquisa serão para introduzir in vitro o meristema gerado pelo enxerto. A partir desse meristema, a intenção é que seja realizado o rejuvenescimento in vitro dos tecidos da árvore-mãe, utilizando a técnica de micropropagação.

A previsão é que se consiga plantas clonais e rejuvenescidas nos próximos 24 meses.

 

Durante o processo de micropropagação, técnica utilizada nas duas etapas da pesquisa, são consideradas cinco fases. Na fase 0, são adotados tratamentos na planta matriz, ou seja, a planta que se deseja clonar. Nessa etapa são coletados meristemas, para que sejam submetidos à inoculação in vitro. Na fase I são estabelecidas as condições ideais para o cultivo in vitro (em tubos de ensaio), com o objetivo de obter tecidos livres de contaminação por vírus, fungos e bactérias.

Na fase II é feita a multiplicação de gemas adventícias, que são meristemas multiplicados in vitro, dos quais originam-se os novos brotos. Durante a fase III ocorre o alongamento dos brotos. Por fim, na fase IV é realizado o enraizamento adventício, ou seja, ocorre a formação da raiz a partir de células do broto, sendo considerada uma fase essencial para o sucesso da clonagem.

Após esse processo, as plantas completas obtidas nas diferentes fases são aclimatizadas. É feita uma adaptação às condições ex vitro, ou seja, fora do tubo de ensaio, para que, finalmente, sejam obtidas as mudas clonais.

Dificuldades no processo de clonagem

Considera-se que as plantas possuem três idades: a idade cronológica, que refere-se à sua idade temporal, desde a germinação até o momento atual da planta; a idade fisiológica, relativa ao vigor da planta e ao seu adequado funcionamento, como resistência, metabolismo e absorção de nutrientes e água; e por último, a idade ontogenética, que diz respeito à transição das suas fases de crescimento, passando de uma planta juvenil para adulta e, posteriormente, chegando à sua fase senil.

A árvore em estudo tem no mínimo 230 anos, ou seja, possui uma idade cronológica avançada. Além disso ela está em sua fase senil, e durante muitos anos não recebeu os devidos cuidados, como adubação e controle de pragas e insetos, para que mantivesse suas funções fisiológicas de maneira adequada. Devido a esses fatores, o processo de clonagem dessa árvore tem sido bastante complexo. Além dos estudos desenvolvidos na UFLA, estão sendo feitas pesquisas para a clonagem da gameleira, cujo nome científico é Ficus lagoensis, por pesquisadores da Gerdau em parceria com a Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Preservação de um símbolo histórico

Após a conclusão da pesquisa na UFLA e obtenção das mudas clonais e rejuvenescidas, o intuito é que algumas amostras sejam doadas para escolas públicas e privadas, além de serem entregues à própria Gerdau. O objetivo é que a partir disso seja feito um trabalho de conscientização e preservação da história mineira. Além disso, uma muda será doada à UFLA e é possível que alguns exemplares sejam plantados em uma área próxima de onde está localizada a árvore-mãe, como forma de reforçar sua simbologia.

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