Morreu nesta sexta-feira (14) aos 95 anos o poeta Thiago de Mello, uma das maiores expressões da poesia brasileira. Thiago vivia há décadas em Barreirinhas, no Amazonas, em uma casa-palafita projetada por Lúcio Costa, um dos criadores de Brasília.
Publicado em dezenas de idiomas, ficamos amigos há sessenta anos, unidos pelas mãos do poeta cubano Roberto Fernandez Retamar. Além de toda a obra, Thiago se celebrizou internacionalmente por “Faz escuro mas eu canto”, trecho de seu poema “Madrugada camponesa”, transcrito abaixo.
Na foto, em um dos prêmios Casa de las Américas, em Cuba, aparecem Thiago, a mediadora do debate, Darcy Ribeiro e eu.
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Madrugada Camponesa
Por Thiago de Mello
Madrugada camponesa,
faz escuro ainda no chão,
mas é preciso plantar.
A noite já foi mais noite,
a manhã já vai chegar.
Não vale mais a canção
feita de medo e arremedo
para enganar solidão.
Agora vale a verdade
cantada simples e sempre,
agora vale a alegria
que se constrói dia a dia
feita de canto e de pão.
Breve há de ser (sinto no ar)
tempo de trigo maduro.
Vai ser tempo de ceifar.
Já se levantam prodígios,
chuva azul no milharal,
estala em flor o feijão,
um leite novo minando
no meu longe seringal.
Já é quase tempo de amor.
Colho um sol que arde no chão,
lavro a luz dentro da cana,
minha alma no seu pendão.
Madrugada camponesa.
Faz escuro (já nem tanto),
vale a pena trabalhar.
Faz escuro mas eu canto
porque a manhã vai chegar.