Pronta para desabrochar
Tenho aqui comigo um CD que buliu com os meus sentimentos: A Flor e o Tempo (lançamento do novo selo Umbilical), trabalho de estreia da cantora Fran Nóbrega. A danada canta como se tivesse um sorriso afinado nos lábios.
Com voz volumosa e vibrante, ela abre o álbum com “Cai Dentro” (Baden Powell e Paulo César Pinheiro). O arranjo é o máximo. O naipe de metais arrasa. Com o samba em ritmo acelerado, entre alguns vocalises, Fran canta os versos com dicção cirúrgica. Sua voz visceral, em meio a versos desabusados, ágeis, lembram Elis Regina. Ao mesmo tempo que a parecença me alegrou, temi: o repertório será todo à moda de Elis?
A seguir, “Entrega” (Alexandre Nóbrega). Foi a vez de um sorriso colar em mim – meu temor se mostrou infundado: Fran demonstrava ali ter bagagem suficiente para semear seu canto com o registro vocal que melhor aprouver à música. Assim como no intermezzo de “Cai Dentro”, outro improviso realça o fascínio de “Entrega”.
“Dois Tempos” (Khrystal Saraiva) traz a sanfona em duo com o violão. A intro chama e Fran não se faz de rogada, vai. Sua voz, amalgamada com a melodia, vem na hora em que a sanfona resfolega na pisada. Com levada arrebatadora, um intermezzo bem construído aviva a agudeza da música de Khrystal.
“Neste Mesmo Lugar” (Klecius Caldas e Armando Cavalcanti) vem para mais uma vez comprovar a diversidade de recursos da voz de Fran Nóbrega. Sua extensão vocal permite ir às notas com rigor. O improviso do baixo fretless é belo. A guitarra e o piano pegam a música pela mão e levam-na ao final. A interpretação do sucesso clássico é prova inconteste de que Fran está pronta para ser uma cantora que florescerá em meio à música brasileira – o que fará com que cresça.
Assim, ó: eu nunca duvidei que, para ter êxito, qualquer intérprete que tenha o jeitão de ter vindo para ficar precise ter como retaguarda um grupo profissional e virtuoso. E é essa galera que compõe a ficha técnica dos discos. Ei-la:
Voz: Fran Nóbrega
Teclados: Salomão Soares
Sanfona: Mestrinho
Guitarra: Danilo Silva
Contrabaixo elétrico, fretless e violão: Michael Pipoquinha
Bateria: Ítalo Vinicius e Jonatan Carvalho Goes
Trompete: Rubinho Antunes
Trombone: Paulo Malheiros
Saxofone alto: Ivan de Andrade
Saxofones tenor e barítono: Diego Lisboa
Direção musical e arranjos: Michael Pipoquinha
Arranjos de sopros e captação dos sopros: Ivan de Andrade
Captação, mixagem e masterização: Magí Batalla (Estúdio U)
Assistência de mixagem: Fernando Sobreira
Fotografias: Luan Cardoso, João Cayres e Luísa Manzin
Design: Lucas Blat
Assessoria de imprensa: Débora Venturini
Coordenação Geral: Luísa Manzin (2018), Cleanto Neto e Magí Batalla
Aos que creem que sem música não há vida, e aos que se atiram de peito aberto em busca de ser profissional desse ofício, rendo minhas homenagens.
Ah, meu Deus, como eu gostaria que, assim como eu ouvi a Fran Nóbrega, ela fosse ouvida por mil e tantas gentes… e assim a música preenchesse toda a sua vida.
Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4
Sobre o Colunista:
Aquiles Rique Reis, niteroiense, logo se dispôs à vida. No MPB4 desde 1965, foi como se tivesse nascido para sempre cantar e muito sentir as dores do mundo, que são também suas. Hoje, ele canta, e há quinze escreve sobre música, com isso se encontra e vive.